Mauro de Campos Adorno Filho
Uma morte esperada
Na tarde desta terça-feira, por volta das 16 horas, recebi uma ligação do jornalista André Paes Leme, informando que o Jornal da Cidade, JC, encerraria suas atividades, colocando ontem seu número derradeiro nas bancas e em casas de assinantes. Notícia que não me surpreendeu, pois esperava esse final melancólico desde os primeiros meses de circulação, há três anos. Conheço os meandros de uma empresa jornalística, pois cheguei a tomar medida idêntica há três anos, ao interromper a circulação do jornal “O Impacto”, depois de 27 anos de circulação ininterrupta. Mas, há diferenças enormes entre os caminhos percorridos entre os dois jornais, especialmente no que diz respeito a conteúdo e, especialmente de conduta ética.
Na oportunidade de lançamento do JC, deu para perceber a voracidade para a conquista do mercado de mídia impressa em Mogi Guaçu, através da prática de concorrência desleal, para se dizer o mínimo. Preços publicitários aviltados deixavam – e tenho essa impressão até hoje – a intenção pura de aniquilar o bom nome da Gazeta Guaçuana, ou simplesmente exterminá-la de um mercado, onde ela conquistou seu espaço com honra e dignidade, através do trabalho árduo e ético de dezenas de profissionais. A visão meramente financeira, sem compromisso com a comunidade, está no próprio texto derradeiro da empresa. “Fomos atraídos a essa região por sua economia em franco crescimento...”.
Há ainda a destacar uma colocação prepotente e infeliz na despedida, ao destacarem que chegaram à região, pois enxergaram “a possibilidade de trazer para esse mercado uma nova visão de comunicação”. Em primeiro lugar, voltando ao parágrafo anterior, a pergunta que se faz é se a região deixou de ter franco crescimento. A volúpia por lucros deve ter tornado o mercado pequeno. Os preços aviltantes podem ter comprometido o caixa e os profissionais pagaram o custo: demissão. Poucos sobraram na derrocada final. Em momento algum se viu no mercado “uma nova visão de comunicação”. Fosse um jornal de qualidade teria conquistado sua parcela no mercado publicitário e não encerraria as atividades. Não há empresário que, vendo seu trabalho reconhecido, encerre as atividades de sua empresa.
Na época da interrupção da circulação de “O Impacto”, após 27 anos de circulação – repito – alertei para o perigo da concorrência predatória. Para enfrentá-la teria que mudar toda a estrutura, pagando salários mais baixos e comprometendo a qualidade do noticiário. Não sucumbi. Indenizei os funcionários e restitui até o último centavo, os valores de assinaturas recebidos por antecipação. Os funcionários foram rapidamente recolocados no mercado de trabalho. Um homem deixou o jornal, mas mercê do trabalho comprometido com a comunidade, “O Impacto” voltou fortalecido, graças a uma equipe jovem e dinâmica - a maioria composta por meus ex-funcionários. O sentimento maior é em relação aos jovens que acreditaram num projeto mal estruturado e hoje estão desempregados. Mas, profissionais como o são, logo estarão em outras redações.
Abordo o assunto por não estar mais sob as amarras de uma ética profissional a que me impus, mas que não tive reciprocidade por parte dos empresários da comunicação impressa. Mogi Guaçu é uma cidade pujante e merece projetos sólidos e não meteóricos. A Gazeta Guaçuana viu diversos títulos chegarem às bancas e naufragarem, mercê de interesses inconfessos que não colocavam a comunidade leitora como peça principal. Outros jornais virão – e a cidade comporta – mas espero que venham com o espírito de servir à população guaçuana. E não se servir dela.
Mauro de Campos Adorno Filho é jornalista
e ex-diretor dos jornais Gazeta Guaçuana e O Impacto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário