domingo, 11 de março de 2012

ATIRARAM DE FUZIL NO JOÃO LINO: MAURINHO ADORNO NO SEU CANTINHO NO BOM JORNAL "O IMPACTO"...



Meu Cantinho O IMPACTO – 10.03.2012

Atiraram de fuzil no João Lino

Mauro Adorno

A rua Ariovaldo Silveira Franco não tinha asfalto e era escura. Em seus lados, aqueles cupins altos e moitas de barba de bode. As belas casas do Jardim Brasília nem pensar. Distantes, apenas umas casas populares lá no fundo, já no Mirante, perto da avenida Jacareí, na rua Interactiano Antonio Albejante Filho, o Tonante, filho do doutor Toninho Albejante, um jovem alegre, cuja vida foi ceifada por um acidente automobilístico em uma péssima estrada nordestina. Nós estávamos ali na sede do Tiro de Guerra, ano de 1969, para cumprir praticamente um ano de serviço militar, na realidade para aprender, além de manuseio de armas e amor à pátria, as boas formas de convívio em família e com amigos. 
Naquela noite escura, um indivíduo começa a subir a avenida, em frente à escola “Pedro Ferreira Alves”. Assobiava tranquilamente. Na frente da sede, armado com um fuzil Mouse 1908, um atirador cumpria um período de duas horas como sentinela. De longe avistou o vulto – um homem coberto com um cobertor para amenizar o frio violento daquele inverno. “Alto lá”, gritou, com o intuito de parar o indivíduo e identificá-lo, uma prática normal em caso de pessoas suspeitas. E nada do indivíduo parar. Ele continuava com seu assobio. O companheiro alertou com mais um “alto lá”, com a voz mais forte e nada. Pensou que a sede poderia ser vítima de um assalto. Chamado, o cabo da guarda, João Batista Moreira, não teve dúvida, abriu fogo.
O sargento Eudes Vieira era o comandante do Tiro de Guerra. Foi responsável pela formação de milhares de jovens nessa terra que adotou como sua. Na sociedade mogimiriana que viveu naqueles idos de 60 e 70, não há quem não tenha desfrutado de seu convívio, direta ou indiretamente. Para manter sua enorme prole, nas horas de folga se dedicava ao comércio de ferro velho, com sua velha perua Kombi. Nela, transportava pequenas quantidades de materiais, mas tinha volume de compras e lucratividade mesmo era com as sucatas descartadas pelas indústrias, especialmente o aço dos tempos áureos em que Mogi Mirim era conhecida como “a capital dos móveis de aço”. Eudes foi transferido para a Bahia, depois Rio de Janeiro, e posteriormente montou escritório de advocacia em Campinas, onde morou até seus últimos dias.
A época era de plena ditadura militar. Eudes não defendia fervorosamente o golpe de 1964. Dizia apenas que os militares que matavam nos porões da ditadura apenas cumpriam ordens. Contava sempre que o capitão Carlos Lamarca havia vindo para Mogi Mirim por diversos anos para fazer o exame final dos atiradores. Lamarca se tornou insurgente ao regime, desertou, e começou a lutar como rebelde. Roubou um caminhão de armas do Quartel de Quitaúna para armar os guerrilheiros. E, poderia vir a Mogi assaltar o TG, dizia ele. Era conversa fiada dele para nos amedrontar e nos deixar alertas nas guardas noturnas. Como poderíamos enfrentar um guerrilheiro - Lamarca - com os velhos fuzis 1908?
O zumbido passou longe do corpo do indivíduo que subia a Ariovaldo Silveira Franco, mas parecia que o raspara. Ele tirou o cobertor das costas e gritou: “Para, sou eu, vocês estão loucos? É o João Lino”. O irmão da magnífica cantora Regina Lino e filho do saudoso e benquisto Mário Lino. Trêmulo, com as pernas bambas, como conta o atirador Paulo Jesus Vital do Prado, o Paulinho do Cartório. Pretendeu, com o cobertor, assustar os companheiros. É lógico que esse episódio não chegou ao conhecimento do sargento Eudes. No dia seguinte roubaram uma bala na sala de armas, e completaram o pente do fuzil. Até nossos dias quando João – Carlos – Lino conta essa história ele tem um friozinho na barriga. Não é por menos.

Mauro de Campos Adorno Filho é jornalista
e ex-diretor dos jornais O Impacto e Gazeta Guaçuana.

(comentário nosso inserido no FACEBOOK - quando da inserção desta bem acessada história do amigo Maurinho - que no seu CANTINHO NO BOM JORNAL "O IMPACTO"  - traz, todo sábado, excelentes narrativas de fatos da região de Mogi Mirim)
LEIAM A HISTÓRIA REAL - narrada pelo dom criativo do amigo e parceiro do saudoso MDB - MAURINHO ADORNO - ATIRARAM DE FUZIL NO JOÃO LINO... saberladino... interagindo com sapientes pessoas que viveram à época da ditadura militar e, alguns, como nós, curtiram alguns dias de cela, até incomunicável, pelo arbítrio de SERES que não respeitavam o direito da livre manifestação da imprensa e queriam nos calar pela força - atitude que mais aguçava no idealismo por Brasil livre e bonito pela sua própria NATUREZA. Mas - com toda certeza - da qual, hoje, compartilhamos com colegas e amigos da velha e lutadora imprensa que, com orgulho, ainda, fazemos parte e, muito nos envaidece por não termos nos ajoelhados aos arbítrios de alguns bossais da baixa mogiana e região de Campinas! (sobre este fato - mesmo após décadas -amigos verdadeiros a gente nunca esquece...) gostaríamos deixar aqui, externado, nosso agradecimento ao advogado, determinado e corajoso, Fernando Oliveira de Abreu Sampaio - que acompanhou meu pai, numa segunda-feira de sol bravo, esperaram autoridades que vinham de Campinas, para nos libertar do arbítrio de um truculento  sargento do exército de Campinas que, segundo o delegado que atendeu ao Fernando e meu pai , este militar já tinha cometido várias irregularidades no município!  Só que, depois de algumas horas, teve a vida salva por iniciativa    minha (juntos a alguns amigos - num  trecho de curvas da  estrada de Pedreira a Jaguariúna) - marcas que o tempo na apaga.   Mas que me ensinaram muito - o quanto é difícil ficar preso e sem comunicação!  Mas, o mal feito é descoberto, usando a  tática enxadrística, consegui avisar o jovem advogado e,  à época, diretor da Rádio Cultura de Mogi Mirim - onde eu e o Nílton Cavalcante Ricci - exercíamos nossa profissão.  Assim fomos liberados - pela iniciativa do amigo Fernando e a compreensão do digno delegado, que até o momento de nada sabia, antes que o militar chegasse de Campinas para o temeroso interrogatório - do qual nos ameaçava! Além de outros dois presos, com influência política,  da cidade de Campinas, que já estavam no temível porão!
Ficam aqui nossas desculpas aos mogimiranos que, por estarem em nossa companhia, sofreram até algumas violências - alguns até já saudosos - caso específico do mirantense - Pedrinho Simplício (que foi covardemente agredido pelo facínora do sargento) e os demais, de tradicionais famílias mogimirianas, tais como Bizigatto (este parecia Jesus Cristo - pois tinha longa barba e "a autoridade" queria cortar), Corsini e Do Valle) - lembranças do terror de alguns dias - em Pedreira - numa cela fria!
Ah - avisamos: estamos por aqui para o que der E VIER... E ATÉ PARA AS BALAS DOS VELHOS FUZIS - DOS QUAIS, EM SERVIÇO - NA QUALIDADE DE CABO -NO COMANDO DA GUARDA DO TG, TIVEMOS TRABALHO PARA GUARDÁ-LOS DO ATAQUE, À ÉPOCA, DAS QUADRILHAS QUE ATACARAM A SEDE DA FEBEM - juntamente com os bravos soldados do TG- BONATTI (Ivan -que um dia nos deu super susto, pois perdeu todas as chaves do alojamento dos fuzis e munição) dos saudosos atiradores - SALVATO (Luíz Gonzaga) HERVAL (Douglas H.Pereira) - TIRAPELE; BOVELONI E BIAZOTTO - atiradores que, corajosamente, empenharam-se naquele primeiro semestre de 1970 - na defesa daqueles superados fuzis que ficavam sob nossa guarda - enquanto a heroica corporação dos militares, que vigiava os famigerados internos da FEBEM - respondiam aos ataques dos grupos paulistanos de ex-internos que queriam resgatar menores perigosos e homicidas famosos no mundo do crime que estavam internados em Mogi Mirim. 
Bom, vamos apreciar a história, também, real do criativo jornalista MAURINHO... ATIRARAM DE FUZIL NO JOÃO LINO... ( hoje, o amigo mirantense da adolescência - João Lino,  além de excelente amigo e tenista veterano é, também, um ótimo contador de causos, saboreando uma gelada, após ótimas partidas de duplas...)
obs - isto foi anexado após o sucesso da crônica do Maurinho - que nos encorajou a contar algumas passagens que, mesmo  algumas pessoas da família não sabiam até momento, por questão de segurança, mas que hoje resolvemos contar parte do nosso passado de rádio no interior e do tempo da ditadura e da arbitrariedade de alguns militares.   Sei que com essa iniciativa - outros contemporâneos que passaram pelas agruras que passamos, com certeza, irão nos procurar , talvez até assustados, pelas nossas costumeiras loucuras, mas farão ricos relatos...
Psiu - veja o que a bem narrada história do TIRO DE FUZIL causou!!!    Coragem, contemporâneos, jamais devemos nos envergonhar por ter ideias de liberdade! 

Meu Cantinho O IMPACTO – 10.03.2012

Atiraram de fuzil no João Lino

Mauro Adorno

A rua Ariovaldo Silveira Franco não tinha asfalto e era escura. Em seus lados, aqueles cupins altos e moitas de barba de bode. As belas casas do Jardim Brasília nem pensar. Distantes, apenas umas casas populares lá no fundo, já no Mirante, perto da avenida Jacareí, na rua Interactiano Antonio Albejante Filho, o Tonante, filho do doutor Toninho Albejante, um jovem alegre, cuja vida foi ceifada por um acidente automobilístico em uma péssima estrada nordestina. Nós estávamos ali na sede do Tiro de Guerra, ano de 1969, para cumprir praticamente um ano de serviço militar, na realidade para aprender, além de manuseio de armas e amor à pátria, as boas formas de convívio em família e com amigos. 
Naquela noite escura, um indivíduo começa a subir a avenida, em frente à escola “Pedro Ferreira Alves”. Assobiava tranquilamente. Na frente da sede, armado com um fuzil Mouse 1908, um atirador cumpria um período de duas horas como sentinela. De longe avistou o vulto – um homem coberto com um cobertor para amenizar o frio violento daquele inverno. “Alto lá”, gritou, com o intuito de parar o indivíduo e identificá-lo, uma prática normal em caso de pessoas suspeitas. E nada do indivíduo parar. Ele continuava com seu assobio. O companheiro alertou com mais um “alto lá”, com a voz mais forte e nada. Pensou que a sede poderia ser vítima de um assalto. Chamado, o cabo da guarda, João Batista Moreira, não teve dúvida, abriu fogo.
O sargento Eudes Vieira era o comandante do Tiro de Guerra. Foi responsável pela formação de milhares de jovens nessa terra que adotou como sua. Na sociedade mogimiriana que viveu naqueles idos de 60 e 70, não há quem não tenha desfrutado de seu convívio, direta ou indiretamente. Para manter sua enorme prole, nas horas de folga se dedicava ao comércio de ferro velho, com sua velha perua Kombi. Nela, transportava pequenas quantidades de materiais, mas tinha volume de compras e lucratividade mesmo era com as sucatas descartadas pelas indústrias, especialmente o aço dos tempos áureos em que Mogi Mirim era conhecida como “a capital dos móveis de aço”. Eudes foi transferido para a Bahia, depois Rio de Janeiro, e posteriormente montou escritório de advocacia em Campinas, onde morou até seus últimos dias.
A época era de plena ditadura militar. Eudes não defendia fervorosamente o golpe de 1964. Dizia apenas que os militares que matavam nos porões da ditadura apenas cumpriam ordens. Contava sempre que o capitão Carlos Lamarca havia vindo para Mogi Mirim por diversos anos para fazer o exame final dos atiradores. Lamarca se tornou insurgente ao regime, desertou, e começou a lutar como rebelde. Roubou um caminhão de armas do Quartel de Quitaúna para armar os guerrilheiros. E, poderia vir a Mogi assaltar o TG, dizia ele. Era conversa fiada dele para nos amedrontar e nos deixar alertas nas guardas noturnas. Como poderíamos enfrentar um guerrilheiro - Lamarca - com os velhos fuzis 1908?
O zumbido passou longe do corpo do indivíduo que subia a Ariovaldo Silveira Franco, mas parecia que o raspara. Ele tirou o cobertor das costas e gritou: “Para, sou eu, vocês estão loucos? É o João Lino”. O irmão da magnífica cantora Regina Lino e filho do saudoso e benquisto Mário Lino. Trêmulo, com as pernas bambas, como conta o atirador Paulo Jesus Vital do Prado, o Paulinho do Cartório. Pretendeu, com o cobertor, assustar os companheiros. É lógico que esse episódio não chegou ao conhecimento do sargento Eudes. No dia seguinte roubaram uma bala na sala de armas, e completaram o pente do fuzil. Até nossos dias quando João – Carlos – Lino conta essa história ele tem um friozinho na barriga. Não é por menos.

Mauro de Campos Adorno Filho é jornalista
e ex-diretor dos jornais O Impacto e Gazeta Guaçuana.
 ·  ·  · Ontem às 06:56 · 

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