Aceitação dos chamados “embargos infringentes” já é tida por alguns advogados como a última alternativa para tentar conseguir uma redução de tempo de pena
Após o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitar a maioria dos recursos dos condenados no julgamento do mensalão, os advogados dos réus apostam agora as suas fichas em um tipo de recurso que ainda divide a Corte: os embargos infringentes . Esse instrumento jurídico dá direito a uma revisão de pena ou mesmo a um novo julgamento para réus que tiveram quatro votos favoráveis à sua absolvição.
Teoricamente, dos 25 réus, 12 podem ter direito a um novo julgamento. Apesar disso, integrantes da Corte e fontes ligadas aos ministros não acreditam em mudanças substanciais de mérito, mesmo que a maioria dos ministros se posicione a favor da aceitação dos embargos infringentes.
Os embargos infringentes não estão previstos no ordenamento jurídico nacional. Os recursos e ações processuais no STF são regulamentados por meio da lei 8.038/1990. O Supremo, contudo, contempla os embargos infringentes em seu regimento interno, por meio do artigo 333, que foi elaborado antes da Constituição de 1988. A questão que divide os ministros e deve ser debatida provavelmente a partir da próxima semana é a seguinte: essa norma do regimento interno do Supremo, escrita antes da Constituição de 88, vale mais que uma lei ordinária pós-Constituição?
Quatro ministros já indicaram que sim: o decano Celso de Mello, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Luis Roberto Barroso. “As normas regimentais do Supremo com força de lei foram recebidas pela nova ordem constitucional com autoridade de lei”, argumentou Mello, na quinta-feira da semana passada. Outros dois já se manifestaram radicalmente contra: o presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, e o ministro Gilmar Mendes. Ele, inclusive, classificou esse recurso como uma “jabuticaba” (algo tipicamente brasileiro). “A rigor, nós não temos precedentes em favor disto”.
Hipóteses
Dos 12 réus que podem ingressar com os embargos infringentes, três têm chances de serem beneficiados com uma progressão de regime, caso a Corte entenda que cometeu equívocos em suas condenações: o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP). Dirceu, Delúbio e Cunha foram condenados à prisão em regime fechado e vão buscar, por meio dos infringentes, cumprir pena em regime semiaberto.
Semana passada
Existem dois réus que podem até mesmo se livrar da cadeia: João Cláudio Genú e Breno Fischberg. O caso do ex-assessor do PP João Cláudio Genú é o mais curioso. Durante o julgamento, ele foi condenado pelos crimes de corrupção passiva, quadrilha e lavagem de dinheiro. As duas primeiras condenações prescreveram e agora ele responde apenas por lavagem. A esperança de seus advogados é que, com os infringentes, ele seja inocentado por lavagem e escape da prisão.
Para Marcos Valério, condenado a mais de 40 anos, a redução de pena seria mínima, caso ele seja beneficiado pelos embargos infringentes. Seu tempo de detenção seria reduzido de 40 anos e 4 meses, para 37 anos e 5 meses. O deputado federal José Genoino também não corre o risco de ser beneficiado com uma progressão de regime, mas ele cumpriria apenas 4 anos e 8 meses de prisão em regime semiaberto.
Chances
Apesar dessas hipóteses, são poucos os ministros e integrantes do Supremo que acreditam em reviravoltas. Os ministros Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso já indicaram que não pretendem entrar em polêmicas ao sugerir quaisquer mudanças nas decisões tomadas em plenário no ano passado. Zavascki e Barroso não participaram do julgamento no ano passado e são apontados como fundamentais para eventuais alterações no entendimento do Supremo sobre os crimes de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
Os dois ministros já se manifestaram serem contrários ao endurecimento do crime de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro determinado durante a primeira fase do julgamento do mensalão. E, caso a Corte admita a existência dos embargos infringentes, os advogados dos réus vão alegar exatamente isso: as condenações por quadrilha e lavagem de dinheiro levaram em conta uma jurisprudência inexistente e excessivamente rígida.
Antes do julgamento do mensalão, havia a possibilidade de absolvição pelo crime de lavagem de dinheiro, caso não houvesse a comprovação do chamado “crime antecedente”. Ou seja, era necessário que o dinheiro “lavado” já tivesse sido obtido por meio da prática de um crime anterior, como um assalto, por exemplo. Agora, não. O Supremo entendeu que basta haver a dissimulação na destinação do dinheiro para que ocorra a condenação.
Antes do julgamento do mensalão, para que uma pessoa fosse condenada por formação de quadrilha, seria necessária a comprovação de que ela também ajudou a organizar a estrutura criminosa. Agora, após o mensalão, uma pessoa pode ser condenada por quadrilha simplesmente se estiver dentro de um grupo criminoso com quatro membros ou mais, mesmo que ela não tenha ajudado a estruturar essa organização.
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