A nova versão do western, em cartaz no Brasil, é excelente, mas, sobretudo pela atuação de Wayne, não deve relegar o clássico de 1969 à prateleira dos "filmes de que papai gosta"
Rodrigo Levino
                              John Wayne, no papel do xerife caolho Rooster Cogburn, na versão de 'Bravura Indomita' (1969) do diretor Henry Hathaway
  Em 1969, o ator John Wayne, já na reta final da carreira, recebeu seu único Oscar pela atuação em Bravura Indômita,  do diretor Henry Hathaway. Na entrega do prêmio, o cowboy durão  capitulou e, emocionado, arrancou risos da platéia ao dizer que, se  soubesse que seria esse o resultado, teria posto um tapa-olho 35 anos  antes – uma referência ao xerife caolho Rooster Cogburn que havia  interpretado.
  Passados 42 anos, há uma nova versão de Bravura Indômita nos  cinemas, com dez indicações ao Oscar 2011. A direção, que concorre a uma  estatueta, é dos irmãos Joel e Ethan Coen, donos de um dos estilos mais  bem definidos do cinema americano (embora neste filme eles tenham  reduzido um tanto sua dose costumeira de ironia). O ator principal, que  também concorre ao prêmio, é Jeff Bridges, um intérprete brilhante que,  aos 62 anos, está em seu auge. 
  Trata-se de um belo filme e, se ele oferece uma experiência tão  satisfatória, é provável que o espectador atual decida que não há  motivos tirar a versão anterior de Bravura Indômita de seu  repouso na estante de “filmes de que meu pai gosta”. Mas não perderá a  jornada quem, em vez disso, visitar o filme clássico para uma comparação  e, sobretudo, por John Wayne – uma personalidade fundamental do cinema.
  Se Bridges é um ator versátil, Wayne foi o oposto disso: um  monolito. Ele tinha marcas registradas, como a entonação de voz e o  jeito de andar, moldado para carregar pela tela, com um misto  inexplicável de graça e rigidez, o corpanzil de mais de 1,90 metro de  altura. Além disso, todos os seus personagens, no faroeste que o  consagrou ou nas incursões por outros gêneros, projetavam uma mesma gama  de valores.
  No romance que deu origem a Bravura Indômita (recém-lançado no  Brasil pela editora Alfaguara), o escritor americano Charles Portis  descreve o xerife Cogburn como um sujeito duro na queda e que  desconhecia o medo. Natural, portanto, que o papel tenha sido entregue a  Wayne. Esse foi o caubói que ele moldou para o cinema a partir de No Tempo das Diligências (1939) – dando a ele ainda outras características, como a franqueza e a lealdade.
  Muitos críticos castigaram Wayne dizendo que ele não sabia atuar – era  apenas ele mesmo diante da câmera. É uma meia verdade. Sua persona foi  construida pedaço a pedaço, com enorme aplicação (não à toa ele deixou  um catálogo de mais de 60 filmes) e com o auxílio de diretores como John  Ford – um esteta e um dos parceiros constantes de Wayne (a quem esse  ouvia com reverência nos sets de filmagem).
  Mas também é fato que Wayne carregava um tanto desse caubói na sua vida  real. Suas opiniões políticas eram de um americanismo sem meios tons.  Com isso, nos anos 60, ele se tornou alvo do patrulhamento ideológico.  Seu apoio à guerra do Vietnã, traduzido inclusive em um filme de  propaganda para o Exército americano, Os Boinas Verdes, fez dele quase um pária num ambiente cultural de crenças contrárias.
  A maneira como John Wayne compôs sua figura cinematográfica e como  ostentou, impávido, opiniões impopulares em seu próprio meio de atuação,  formam uma daquelas histórias tão raras quanto são hoje os westerns.  Eis aí porque ele não pode ser esquecido.
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Assista ao trailer do filme
                   
                   
